Caso Benício: mais de 20 depoimentos marcam avanço da investigação; veja o que foi revelado até agora
11/12/2025
(Foto: Reprodução) Caso Benício: médicas apontam overdose por dose 15 vezes maior de adrenalina
A Polícia Civil do Amazonas já ouviu mais de 20 pessoas no inquérito que apura a morte de Benício Xavier, de 6 anos, após a aplicação errada de adrenalina no Hospital Santa Júlia, em Manaus.
Entre os depoentes estão os pais da criança, a médica Juliana Brasil, responsável pela prescrição do medicamento, a técnica de enfermagem Raiza Bentes, que aplicou a dose, e outros profissionais da unidade de saúde.
Benício morreu na madrugada de 23 de novembro, cerca de 14 horas após dar entrada no hospital com suspeita de laringite. Em documento enviado à polícia, a médica reconheceu ter cometido erro ao prescrever adrenalina por via intravenosa em vez de nebulização.
O caso é investigado como homicídio doloso e tanto Juliana Brasil quanto Raiza Bentes respondem ao inquérito em liberdade.
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Até terça-feira (9), a polícia ouviu outros depoentes, incluindo médicos, enfermeiros, técnicos e familiares de Benício. Veja abaixo:
Joyce Xavier e Bruno Melo de Freitas, pais de Benício;
Cinco médicos;
Cinco enfermeiros;
Quatro técnicos de enfermagem;
Dois fisioterapeutas;
Dois farmacêuticos;
Técnicos de informática;
Uma pessoa que estava na recepção do hospital no dia do atendimento.
Na quarta-feira (10), a polícia ouviu técnicos de informática do hospital para esclarecer dúvidas sobre o funcionamento do programa usado na prescrição de medicamentos, após a defesa de Juliana Brasil alegar que o sistema teria alterado automaticamente a via de aplicação da adrenalina.
A quantidade exata de técnicos ouvidos não foi divulgada. O delegado Marcelo Martins também informou que foi protocolado um pedido de perícia no sistema do hospital.
Veja a cronologia do atendimento que levou à morte de criança após aplicação de adrenalina
O que dizem os pais
As oitivas começaram no dia 25 de novembro, com o depoimento dos pais. Às autoridades, Joyce e Bruno relataram que o menino foi levado ao hospital com tosse seca e suspeita de laringite. Ele contou que a médica prescreveu lavagem nasal, soro, xarope e três doses de adrenalina intravenosa, 3 ml a cada 30 minutos.
O pai de Benício relatou que após a aplicação, a criança apresentou palidez e afirmou sentir o coração "queimando". Após a intubação, o homem informou que o filho apresentou sangramentos causados por vômitos e que acompanhou as últimas tentativas de reanimar o menino.
A mãe de Benício reforçou a versão do marido e complementou afirmando que "alguns profissionais apresentavam preocupação com a conduta da médica Juliana Brasil".
O que disse Juliana Brasil
A médica Juliana Brasil foi ouvida no dia 28 de novembro. Ela narra que comentou com a mãe da criança que a medicação deveria ser administrada por via oral e disse ter se surpreendido por a equipe de enfermagem não questionar a prescrição.
Posteriormente, a defesa afirmou que a médica reconheceu o erro “no calor do momento”, mas atribuiu a prescrição de adrenalina intravenosa a uma falha do sistema do Hospital Santa Júlia.
Os advogados apresentaram um vídeo que, segundo eles, mostra problemas na plataforma de prescrição utilizada pelo hospital.
O que disse Raiza Bentes Praia
A profissional prestou depoimento, também em 28 de novembro, e afirmou que apenas seguiu a prescrição médica ao aplicar a dose de adrenalina em Benício Xavier.
Segundo ela, a medicação foi administrada via intravenosa e sem diluição, conforme constava na prescrição da médica Juliana Brasil Santos. Raiza também disse que avisou a mãe da criança sobre o procedimento e mostrou a prescrição.
A profissional disse que a prescrição previa três doses de adrenalina a cada 30 minutos, mas que aplicou apenas uma dose. Pouco depois, Benício apresentou palidez, dor no peito e dificuldade para respirar. Ela contou que chamou a médica responsável, que teria orientado a “aguardar”.
Raiza ressaltou que tem sete meses de formação e que não poderia realizar nenhum procedimento sem prescrição.
Caso Benício: veja cronologia do atendimento que levou à morte de criança
Profissionais do hospital
A polícia ouviu também, no dia 1º de dezembro, o médico Enryko Garcia, que confirmou a troca de mensagens com a médica Juliana Brasil, e o enfermeiro Tairo Neves Maciel, que confirmou a versão da técnica de enfermagem de ter ficado sozinha no atendimento, contrariando o relato da médica.
Na terça (2), outras seis pessoas foram escutadas, entre elas um médico e três enfermeiros que estavam de plantão na UTI do Hospital Santa Júlia no dia da morte. Os pais de Benício também foram chamados novamente para confirmar informações já recebidas pela polícia.
No dia 3 de dezembro, a enfermeira Fracineide Macedo e a técnica de enfermagem Tabita Costa, que trabalharam no atendimento de Benício após as complicações de saúde, disseram em depoimento que esconderam dentro do jaleco a prescrição médica que autorizou a aplicação de adrenalina na veia por medo de que a médica Juliana Brasil alterasse o documento após perceber o erro.
A enfermeira Francineide Macedo contou que, logo após o agravamento do quadro de Benício, recomendou com urgência a transferência do menino para a UTI. Segundo ela, a médica chegou a questionar a internação.
Temendo que a médica rasgasse a prescrição para emitir uma nova, Francineide guardou o documento no bolso, que posteriormente chegou às mãos da técnica Tabita.
Já a técnica Tabita Costa disse que manteve a prescrição impressa em seu jaleco enquanto fazia as anotações do atendimento.
Após a transferência de Benício para a UTI, ela foi procurada por Tairo Maciel, chefe dos técnicos de enfermagem, que pediu que não entregasse o documento à médica.
Tabita manteve a prescrição com ela até devolvê-la a Tairo, que continuou guardando o documento.
A ordem cronológica exata de como o documento foi repassado não foi detalhada no relatório dos depoimentos.
Entre os dias 4 e 9 de dezembro, o delegado Marcelo Martins ouviu outros profissionais dos setores de enfermagem, fisioterapia e farmácia do Hospital Santa Júlia. Ao menos três deles afirmaram que a médica tentou adulterar o prontuário médico para omitir o erro na prescrição de altas doses de adrenalina.
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Novos depoimentos e acareação
No dia 5 de dezembro, a polícia realizou uma acareação entre Juliana e Raiza após divergências nos depoimentos. Segundo o delegado Marcelo Martins, ambas mantiveram as mesmas versões relatadas no primeiro depoimento.
O delegado Marcelo Martins, responsável pelo inquérito, informou que novos depoimentos serão colhidos nos próximos dias. Ele adiantou à Rede Amazônica que a Polícia Civil deve marcar uma acareação entre a técnica de enfermagem Raiza Bentes Praia e a técnica Rocicleide Lopes de Oliveira.
Rocicleide disse à polícia que orientou Raiza a não aplicar “3 ml de adrenalina pela veia, pois esse volume só é usado em casos de parada cardiorrespiratória”.
Também deve ser ouvido o gestor do Hospital Santa Júlia, em data não informada.
Overdose e estrutura precária
Pai de Benício ficou ao lado do filho durante seus últimos momentos.
Reprodução/TV Globo/Fantástico
Benício Xavier morreu após receber uma dose de adrenalina 15 vezes maior que a recomendada para casos de parada cardiorrespiratória, segundo depoimento da coordenadora da UTI pediátrica do Hospital Santa Júlia, Ana Rosa Pedreira Varela.
A médica Alexandra Procópio da Silva também relatou à Polícia Civil que a UTI enfrentava falta de equipamentos essenciais, como máscara laríngea e bugi, principalmente em tamanhos adequados para crianças, o que teria limitado a atuação da equipe.
O caso é investigado como homicídio, e a médica Juliana Brasil Santos, que prescreveu a adrenalina, e a técnica de enfermagem Raiza Bentes, que aplicou o medicamento, são apontadas como suspeitas.
Habeas corpus de médica em análise
Caso Benício: médica e técnica de enfermagem ficam frente a frente em acareação
O Tribunal de Justiça do Amazonas analisa se mantém ou revoga o habeas corpus preventivo da médica Juliana Brasil, que prescreveu a adrenalina aplicada na veia do menino Benício Xavier.
A decisão será tomada após informações apresentadas pelo delegado Marcelo Martins, que detalhou o andamento das investigações e afirmou que vai pedir perícia no sistema eletrônico do hospital.
A defesa da médica alega falhas no sistema, que teriam impresso a dose intravenosa em vez da via inalatória.
Infográfico - Caso Benício
Arte g1